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4 de setembro de 2017

O déficit público do Brasil, o que nós temos a ver com isso?

Por Marcelo Queiroz
Presidente do Sistema Fecomércio RN

Cento e cinquenta e nove bilhões de reais. Este será, depois de muita negociação, ajustes e acordos, o valor do déficit primário brasileiro este ano e em 2018. Diante das várias linhas em blogs, portais e jornais e dos muitos minutos em TVs e rádios empregados para tratar o tema, o cidadão comum, em sua maioria, deve ter se perguntado: E que eu tenho a ver com isso? Muito! Todos nós, brasileiros, temos, e muito, a ver com isso.

Este artigo foi publicado em 02 de setembro de 2017 no jornal Tribuna do Norte

E por um motivo muito simples: esta conta é paga por nós. E de várias formas. Quando afirma que irá prever um rombo de R$ 159 bilhões por dois anos seguidos nas suas contas, o que o governo está nos dizendo é que, este ano e no ano que vem, irá gastar, ao todo, R$ 318 bilhões a mais do que irá arrecadar. Isto equivale a quase três vezes o que o país gasta por ano em saúde e a quase quatro vezes o que gasta com educação.

A receita estimada da União para este ano é de algo em torno de R$ 3,1 trilhões. Uma verdadeira fortuna. Mas, mesmo assim, o governo irá gastar R$ 159 bilhões a mais (cerca de 5%). Para 2018, a receita prevista é de R$ 3,2 trilhões, e o governo, ainda assim, estima gastar outros R$ 159 bilhões a mais.

Na história recente (considerando os dados desde 2001, quando se inicia a série histórica do Banco Central), somente a partir de 2014 a máquina estatal brasileira começou, literalmente, a não caber no que ela arrecadava. Naquele ano, o país sediou a Copa do Mundo Fifa e a economia ainda estava aquecida. Mesmo assim, as despesas da máquina estatal superaram as receitas em R$ 32,53 bilhões, um rombo, como eu já disse, histórico, mas que hoje fica quase imperceptível diante da evolução deste descompasso.

Senão, vejamos: já em 2015 o déficit teve uma progressão assustadora, atingindo incríveis R$ 115 bilhões (quase quatro vezes o rombo do ano anterior). No ano passado, novo aumento, chegando a R$ 154 bilhões. Coloquemos aí mais R$ 5 bilhões e chegamos ao déficit previsto para este ano e o próximo. Se somarmos o saldo negativo desde 2014 até o final de 2018, chegaremos à incrível quantia de R$ 619, 5 bilhões.

Somente a título de comparação, o PIB do nosso Rio Grande do Norte (ou seja, a soma de todas as riquezas produzidas aqui) é de R$ 59,2 bilhões. Isto mesmo: em cinco anos, a União irá gastar, além do que arrecada, mais de dez vezes o PIB do nosso Estado.

Um verdadeiro absurdo. E um absurdo que leva a União a deixar de cumprir com algumas de suas funções. Por exemplo, o investimento público está estagnado há seis anos. E a economia brasileira como um todo, sobretudo a do Nordeste, é, sim, extremamente dependente destes investimentos. São novas estradas, portos e ferrovias que deixam de ser construídas, por exemplo. Também deixam de ser feitas novas escolas, hospitais ou estruturas ligadas ao aparato da segurança. Impactos, diretos e indiretos, no nosso dia a dia.

Além disso, ao gastar mais do que arrecada, o Governo se vê obrigado a captar recursos no mercado financeiro, pagando, por eles, cada vez mais caro. E é esta necessidade de captar recursos no mercado um dos grandes influenciadores da definição da chamada taxa básica de juros (a famosa Selic), que, por sua vez, tem reflexos nas taxas de juros de todo o mercado de crédito do país, ou seja, no nosso bolso.

Os números são incontestáveis. O governo precisa caber em si. Caber, com sobras, no que arrecada, até porque, já arrecada muito (nunca é demais lembrar que a carga tributária brasileira é uma das maiores do mundo).

E o caminho para isso passa, inevitavelmente, pelas reformas estruturais. Todas, desde a previdenciária (a Previdência deixou um déficit, somente no ano passado, de mais de R$ 150 bilhões) até a política (falar em um fundo eleitoral de R$ 3,6 bilhões é uma piada de péssimo gosto), passando pela tributária. Também é urgente a elaboração de um plano de desestatização (o já anunciado ainda parece muito tímido diante do tamanho do descompasso entre receitas e despesas) e de uma reforma administrativa que traga o funcionalismo público para uma realidade mais próxima daquela vivida pelos demais trabalhadores do país que é de salários menores (em uma mesma função, um servidor público chega, em alguns casos, a ganhar quase dez vezes mais que um trabalhador do setor privado), maior produtividade e eficiência.

Sem isso, o Brasil seguirá no buraco. E em um buraco cada vez mais profundo.

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