Marcelo Queiroz, presidente da Fecomércio RN
Aprovado pelo plenário do Senado no final do mês de agosto, o Projeto de Lei 2.384/2023 devolve o voto de desempate no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) aos presidentes das Câmaras, que são sempre conselheiros representantes e, por conseguinte, favoráveis aos interesses da Fazenda Nacional. A medida altera de forma contrária à Lei 13.988, de 2020, que dava a vitória para os contribuintes.
O Carf, órgão do Ministério da Fazenda, é o responsável por julgar demandas tributárias envolvendo os contribuintes e a Receita Federal, na esfera administrativa. Por isso, ao dar a palavra final para os representantes do Fisco, o novo PL foca exclusivamente no aumento da arrecadação, em um contexto tributário que, por si só, já penaliza todo o setor produtivo.
Na prática, a medida é uma das várias cartas na manga do governo, que está buscando meios de reforçar a arrecadação em 2024. Se sancionado pelo Presidente, o retorno do voto de qualidade deve render até R$ 60 bilhões por ano. Ou seja, o foco do Ministério da Fazenda é ter mais dinheiro em caixa, mesmo que isso sobrecarregue ainda mais os contribuintes.
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo no Rio Grande do Norte, conforme vinha se manifestando junto aos parlamentares da nossa bancada federal, compartilha o posicionamento da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e buscou formas de evitar que essa medida fosse aprovada. Na condição de maior representante do setor produtivo no estado, a Fecomércio acredita que a sanção do PL 2.384/2023 é um grande retrocesso.
Além disso, vale ressaltar que a sanção dessa mudança no voto de desempate do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais é uma clara violação ao artigo 112 do Código Tributário Nacional (CTN), lei complementar – e, portanto, superior às leis ordinárias – a qual prevê que, em caso de dúvida nas disputas tributárias, devem prevalecer os interesses do sujeito.
Importante ainda realçar que a aprovação do PL 2.384/2023 afronta diretamente o princípio “in dubio pro contribuinte”. Trata-se de princípio do direito ao qual as regras devem se subordinar, como é sabido no mundo jurídico. Com base no referido princípio, o empate deve sempre favorecer o contribuinte, independentemente da norma legal, o que está sendo posto por terra na proposta legislativa aprovada.
Compreendemos, ainda, que o voto de qualidade no processo administrativo fiscal viola os princípios do devido processo legal e da igualdade processual. Ele é um método ultrapassado, especialmente no regime constitucional brasileiro, além de colocar por terra a ideia primordial da existência do CARF que é o julgamento de temas conflitantes na seara administrativa com “igualdade de armas” (mesmo número de votos entre os representantes do contribuinte e fazenda), já que sempre ocorrerá um voto a mais para os representantes da Fazenda, enfraquecendo assim a premissa de garantir os direitos fundamentais do cidadão-contribuinte. É mais um retrocesso que, infelizmente, torna o ambiente de negócios hostil ao empreendedorismo no País.