Marcelo Fernandes de Queiroz
Presidente do Sistema Fecomércio RN
A semana que passou foi pontuada, mais uma vez, pelo debate em torno dos recursos destinados pelo Executivo Estadual aos chamados Poderes Autônomos. Dois fatos novos reavivaram o tema. O primeiro foi a decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – por intermédio da conselheira Daldice Santana – de, ao tempo em que proibiu o “empréstimo” de cerca de R$ 100 milhões que o Tribunal de Justiça pretendia fazer ao Governo do Estado do RN, determinar que o órgão do Judiciário devolva aos cofres públicos o saldo que mantém em suas contas. Saldo este oriundo, em sua maioria, de sobras orçamentárias de anos anteriores. O valor é estimado em R$ 573 milhões (parte disso, registre-se, proveniente de receitas próprias que não entrariam nesta obrigação). Um detalhe: o TJ já anunciou que vai recorrer desta determinação, ao seu próprio Pleno.
O segundo fato foi a informação – divulgada de forma maciça pela imprensa – de que, juntos, TJ e Ministério Público pagaram, nas respectivas folhas de pessoal relativas ao mês de abril, algo em torno de R$ 60 milhões em valores extras a juízes, promotores e alguns servidores. Tratam-se de pagamentos relativos a férias e licenças-prêmio não gozadas. Houve casos individuais em que o montante recebido passou dos R$ 170 mil em um único mês.
Enquanto isso, a maioria das dezenas de milhares de servidores do Poder Executivo continua recebendo seus salários com atraso e o Governo segue com imensa dificuldade para honrar, além deste, outros compromissos como manter as estruturas de educação, saúde e segurança, e pagar aos seus fornecedores.
Cabe, portanto, a pergunta que dá título a este artigo. Parece claro que os pagamentos destes valores extraordinários aos servidores do MP e do TJ, assim como a decisão deste último de recorrer para não ter que devolver o dinheiro que mantém em caixa ao seu lugar de origem e de direito, são legais. Afinal, não se poderia esperar outra coisa destes dois órgãos (um que aplica e outro que fiscaliza o respeito às Leis).
Mas, será que esta é uma questão apenas legal? Cumpre aqui lembrar alguns dados que, no contexto de todo este debate, podem ter se perdido na memória dos potiguares.
Os cofres públicos do Rio Grande do Norte – alimentados, nunca é demais ressaltar, com o dinheiro pago por cada um dos cidadãos potiguares em impostos e taxas – repassaram, em 2016, quase R$ 1,5 bilhão aos poderes autônomos (que incluem, além do TJ e MP, a Assembleia Legislativa, o Tribunal de Contas do Estado e a Defensoria Pública). Somente ao TJ e ao MP foram repassados R$ 1,07 bilhão (R$ 794 milhões ao TJ e R$ 276 milhões ao MP).
O Tribunal de Justiça ficou, sozinho, com 12,34% de toda a receita orçamentária líquida do Estado em 2016. O MP, por sua vez, ficou com 4,3%. À Assembleia Legislativa couberam 4,6% de tudo o que o Estado tinha para honrar seus compromissos. Somando-se todos os poderes autônomos, o percentual deste repasse atingiu no ano passado 23% das receitas líquidas.
Para 2017, com base no Orçamento em vigor, juntos, TJ e MP irão ficar com mais de 16% de toda a receita orçamentária líquida do RN, uma nota de R$ 1,12 bilhão. Somando-se a Assembleia Legislativa a este rol, teremos 20,02% da receita, ou R$ 1,44 bilhão para custear estes três poderes autônomos.
Diante destes números e das conhecidas dificuldades orçamentárias e financeiras pelas quais passa o RN – com reflexo diretos no dia a dia de todos os potiguares – repito a pergunta: Será que esta é apenas uma questão legal? A melhor resposta, a meu ver, deve vir da sociedade.