Caso aprovado, o texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária, apresentado pelo relator Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), terá impacto significativo de 260% na carga tributária no setor de serviços ou um aumento de cerca de R$ 200 bilhões no recolhimento de impostos no País. É o que aponta um estudo divulgado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). A pesquisa mostra também que a reforma pode causar 3,8 milhões de demissões no setor de serviços.
Embora defendam a reformulação do sistema de tributação, economistas destacam que o consumidor final será o principal penalizado com a proposta apresentada até o momento. O economista e professor universitário Janduir Nóbrega explica que as discussões da reforma passam por uma tentativa de encontrar um equilíbrio entre balancear os impactos para o consumidor, não onerar a classe produtiva e não diminuir a capacidade de arrecadação dos entes federativos.
Nessa equação, o especialista diz que “a conta” vai acabar sobrando para o que chama de “elo mais fraco”. “Dentro desses pilares, a melhor proposta, o melhor caminho vai ser encontrado, mas, na minha percepção de mercado e sociedade, acho muito improvável que o consumidor não seja o mais penalizado. Nesse ‘tripé de desejo’, o consumidor é o elo mais fraco. É primordial que a reforma aconteça. Isso é fundamental porque a evolução do mercado é muito rápida e a questão tributária está muito defasada. Tecnicamente a gente precisaria de um olhar onde a sociedade não fosse tão penalizada”, detalha Nóbrega.
Segundo o estudo da CNC, os cinco segmentos mais impactados pelo aumento da carga tributária seriam atividades recreativas e culturais (171%); serviços pessoais (160%); seleção, agenciamento e locação de mão de obra (157%); serviços de alojamento (153%); e serviços para edifícios e atividades paisagísticas (145%). No comércio, os mais atingidos deverão ser os do varejo e atacado de calçados (41,2% e 37,3%, respectivamente); atacado de equipamentos e artigos de uso pessoal e doméstico (32,2%); varejo de vestuário (31,8%); e varejo de tecidos (31,4%).
Conforme os cálculos da CNC, a alíquota considerada pelo governo para o futuro Imposto sobre Valor Agregado (IVA), fixada 25%, representaria uma ameaça a 3,8 milhões de postos de emprego, devido a compensação do aumento da carga tributária. Fábio Bentes, economista sênior da CNC, detalha que uma maior cobrança de impostos forçaria as empresas a adequarem seus fluxos de caixa com a eliminação de empregos.
“Isso obviamente pode fazer com que algumas vagas tenham que ser eliminadas para se ajustar ao fluxo de caixa das empresas à essa nova realidade tributária. Para o setor de serviços significa o aumento de mais de R$ 200 bilhões em pagamento de impostos, isso equivale a 30% de tudo que o setor gasta com folha de pagamento. De cada 10 empregos no setor, três podem estar ameaçados por conta desse aumento na carga tributária do setor”, pontua.
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Rio Grande do Norte (Fecomércio RN) acredita que a reforma tributária é essencial ao desenvolvimento econômico do País, mas não pode penalizar o setor de serviços, que é o que mais avança e foi o primeiro a ajudar os brasileiros na recuperação pós-pandemia. “Defendemos que o Brasil precisa, sim, de uma reforma que reduza a complexidade do sistema, entretanto, não há mais espaço para novos aumentos da carga tributária. As empresas brasileiras estão sobrecarregadas. Nós apoiamos uma reforma tributária eficiente, que poderá impulsionar a geração de empregos, atrair investimentos, incentivar a inovação e fortalecer a economia”, diz a entidade.
PEC votada em dois turnos
O texto da PEC da reforma tributária ainda pode sofrer alterações. O relator Aguinaldo Ribeiro entregará o documento para a Mesa Diretora da Câmara, e o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), poderá pautar o projeto. Tanto Ribeiro quanto o coordenador do grupo de trabalho que avaliou a matéria na Câmara, Reginaldo Lopes (PT-MG), consideram o texto como uma versão preliminar. A expectativa é de que Lira paute a votação a matéria no plenário até 7 de julho.
A PEC será discutida e votada em dois turnos, e será aprovada se obtiver três quintos dos votos dos deputados (308). Depois, é a vez de ser encaminhada para apreciação no Senado no mesmo processo, e deve ser aprovada por três quintos dos membros da Casa em duas votações.
Entenda
Principais pontos da reforma tributária
1. Tributos extintos
IPI (federal), PIS (federal), Cofins (federal), ICMS (estadual) e ISS (municipal)
2. IVA (Imposto sobre Valor Agregado) dual
Serão criados dois IVAs: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substituirá o ICMS dos Estados e o ISS dos municípios; e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que vai unificar os tributos federais: PIS, Cofins e IPI, com base ampla e não cumulatividade plena na cadeia de produção – ou seja, sem tributação em cascata. O imposto será cobrado no destino (local do consumo do bem ou serviço), e não na origem, como é hoje. Haverá desoneração de exportações e investimentos.
3. Imposto Seletivo
Incidirá sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, como cigarro e bebidas alcoólicas, desonerando as exportações. Será usado para substituição do IPI e usado para manter a Zona Franca de Manaus.
4. Alíquotas
Haverá a alíquota única, como regra geral, e a alíquota reduzida Oito grupos de produtos e serviços terão alíquota reduzida em 50%.
5. Medicamentos e Prouni
Isenção para medicamentos e redução em 100% da alíquota da CBS incidente sobre serviços de educação de ensino superior (Prouni).
6. Cashback
Criação da possibilidade de devolução do IBS e da CBS a pessoas físicas de forma ampla, a ser definida em lei complementar.
7. Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FDR)
Cria o fundo com o objetivo de reduzir as desigualdades regionais e sociais. Os recursos terão de ser aplicados em: realização de estudos, projetos e obras de infraestrutura; fomento a atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda, incluindo a concessão de subvenções; ações para o desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação.
8. Regimes tributários específicos
Combustíveis e lubrificantes: Cobrança monofásica (cobrado numa única fase da cadeia), alíquotas uniformes e possibilidade de concessão de crédito para contribuinte do imposto.
Serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e apostas (concursos de prognósticos): alterações nas alíquotas, nas regras de creditamento e na base de cálculo; e tributação com base na receita ou no faturamento.
Compras governamentais: Não incidência de IBS e CBS, admitida a manutenção dos créditos relativos às operações anteriores; destinação integral do produto da arrecadação do IBS e da CBS recolhida ao ente federativo contratante (União, Estado ou município).
9. IPTU
Autoriza que o Poder Executivo atualize a base de cálculo do imposto por decreto a partir de critérios gerais previstos em lei municipal. Atende a um pleito das prefeituras.
10. Desoneração da folha
O aumento da arrecadação obtida com ela deve ser utilizado para reduzir a tributação incidente sobre a folha de pagamentos e sobre o consumo de bens e serviços.
Fonte: Tribuna do Norte